Os
professores Márcia Cappellano dos Santos e Antonio Jorge Fernandes ambos do
Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hospitalidade – UCS, e o professor Michel
Bregolin, do Programa de Hospitalidade – UCS, tiveram participação de destaque no I Seminário
Observatório de Turismo do Rio Grande do Sul, realizado no ultimo dia 18 de
outubro, em Porto Alegre. Promoção da Secretaria de Turismo do Estado, o evento
teve por objetivo discutir a importância dos observatórios, ao reunir e
consolidar informações sobre a atividade turística, que sirvam de ferramenta
auxiliar para tomada de decisões por autoridades públicas e privadas. Nesse
sentido, como destacou a represente da Secretaria de Turismo, Camila L. Silva, são
de extrema importância as parcerias entre poder público e academia, para que
tais objetivos sejam alcançados
Na
primeira mesa do Seminário – “Estudos e Pesquisas no Turismo Analisados pelo
Viés Ecônomico” - falaram os economistas Leandro de Lemos (PUCRS), Antonio
Jorge Fernandes (UCS), Carlos Paiva (FACCT) e Wilson Rabahy (USP). Lemos
destacou discussões realizadas desde 1998, no âmbito do Curso de Turismo da PUCRS,
que já então buscavam construir redes de parceiros, como um espaço de dialogo
democrático com a sociedade, voltadas para um turismo que priorizasse o
desenvolvimento social e humano, como um valor a nortear as ações na área. Um
turismo onde houvesse a produção própria de riqueza e não apenas transferência de
renda. Ainda segundo o mesmo economista, entender o turismo academicamente como
uma atividade multidisciplinar exige humildade teórica no seu estudo e pesquisa,
para que todos as facetas do processo de produção turística sejam consideradas.
Rabahy
registrou que o turismo tem crescido a 4.13% ao ano, um pouco acima do PIB
mundial, que cresce a 3.45%. Lembrou que o receptivo é contratado nas regiões
ricas, mas que a tendência de longo prazo será para a descentralização. As
pesquisas registram que o receptivo ainda se concentra nas regiões mais ricas,
mas que a maioria absoluta das viagens
se dão dentro do próprio continente do viajante, muito embora as viagens
internacionais mobilizem maiores valores. O maior emissor é a Europa, mas
também o maior receptor, ou seja, teríamos um turismo de região rica para
região rica. Hoje, 15 países concentram 51% das receitas e dos gastos
turísticos. No Brasil, 50% dos turistas originam-se na própria
América Latina , embora esse número já tenha sido de 70%, a metade deles com
acesso via terrestre. Outro dado apresentado por Rabahy é de que, quanto maior
a distância percorrida pelo turista, maior será o seu gasto no destino.
Paiva
destacou que seu próprio conceito de turista, considerando como tal quem ganha
em um lugar e gasta em outro. O economista pretendendo com isso questionar alguns
conceituados vigentes, no que se refere ao turismo. Destacou, ainda a figura e
a importância do que chama de turista permanente, compreendendo por tal pessoas
como os aposentados, por exemplo, que na situação de liberação das atividades
profissionais passam a residir em localidades turísticas. Citou pesquisa por
ele realizada em Foz do Iguaçu, por ele realizada, que utilizou o que considera
como novas formulações conceituais, para concluir que 50% da renda local tem por
sua origem no turismo. Para chegar a esse número, comparou as médias estaduais
com as médias locais em diferentes setores econômicos, concluindo que as diferenças
locais, para mais, seriam de origem turística.
Antonio
Jorge Fernandes apresentou a situação de Portugal, país que, segundo ele, possui uma área que é de um quarto a do Rio
Grande do Sul, mas que possui quase a mesma população do Estado sul brasileiro,
e que receberia 10 milhões de turistas ano. Tal volume de turistas significaria
um impacto econômico de 10% do PIB do país luso, ocupando 8% da mão de obra e significando 46%
das exportações de serviços
Na
mesa seguinte – “Estudos e Pesquisas no Turismo Analisados pelo Viés
Sociológico” - com coordenação de Beatriz Paulus, os professores Mário Riedl e Marutscka
Moesch destacaram as implicações sociais e antropológicas do turismo. Para Moesch,
acolher seria a categoria fundaste do turismo. Sob o ponto de vista sociológico,
para falar sobre Observatório seria necessário questionar, por exemplo, o que é
o observar. Ou, perguntar para que serve / servirá o dado coletado. Tentativas
de construir um único parâmetro de conhecimento demonstraram-se infrutíferas.
Para Moesch, as contas satélites nada mais seriam do que tentativas de
domesticar dados que são, por natureza, indomesticáveis. O turismo é por
natureza transgressor, sistêmico, complexo e interdisciplinar. E citou como
exemplo a implantação do ônibus turístico de Porto alegre, alcançada via
orçamento participativo da cidade, o que só foi alcançado com auxílio dos
papeleiros, um dos grupos melhor organizados para alcançar seus objetivos,
dentro do OP. Os modelos tradicionais, hoje, seriam insuficientes porque não
estamos, mais, em presença do turismo de massa dos anos 1970, mas de um turista
que poderá ir, sim, a uma localidade como Santa Vitória do Palmar, se tal for
para ele o vivenciar uma experiência diferenciada (antes, um palestrante
desqualificara tal localidade nas suas possibilidades turísticas). Segundo
Moesch, outros dados precisam ser cruzados pelos observatórios de turismo, como
por exemplo, o da grande presença de mão de obra feminina, cuja escolaridade
media continua sendo baixa, mas que são chefes de família e moram longe do
local de trabalho. São mulheres expostas a percorrer longas distancias, além da
dupla ou tripla jornada de trabalho, o que inviabiliza sua participação em
cursos do Pronatec, por exemplo. Para esses casos, estudos que utilizem, por
exemplo, como metodologia a teoria de campo, de Bourdieu, poderiam ser úteis.
No
período da tarde, foram outras mesas apresentaram dados estatísticos, embora
fosse questionada a cultura estatística da comunidade turística. Michel
Bregolin, Pablo Herrera (Argentina) e Álvaro Sanguinetti (Uruguai) integraram a
mesa “ Apresentação de Dados que Subsidiem a a Composição de Núcleos de Estudos
e Pesquisas”. Mário Cabral, do Ministério do Turismo, realizou a palestra
“Núcleos de Estudos e Pesquisas em Turismo”.
Na
mesa de abertura do evento, a professora Márcia M. Cappellano dos Santos, do
Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade de Caxias do Sul, destacou
na sua fala, a concepção de Observatório de Turismo. A seguir, reproduzimos na
íntegra, a sua explanação.
OBSERVATÓRIO
DE TURISMO PELA DRA. MARCIA MARIA CAPPELLANO DOS SANTOS
Na qualidade de representante, no Conselho
Estadual de Turismo, das instituições que têm o turismo como objeto de
pesquisa, como objeto de estudo nos diferentes níveis de ensino, quero
primeiramente registrar meu agradecimento pela oportunidade de integrar esta
mesa e aqui tentar ser portadora da voz da Academia referentemente à sua
colaboração na implementação Câmara de Estudos e Pesquisas – Observatório de
Turismo e, de modo especial, relativamente a este importante evento.
Sem querer me estender – não é essa minha intenção
–, creio que este seria um momento de
suscitar uma reflexão sobre o “observar”, verbo que está na raiz do termo
Observatório, este, que seria, então, um espaço destinado à observação. Trago
assim algumas questões para juntar-se às reflexões previstas e que se
desenrolarão ao longo deste dia: O que se pode/deve observar? Que sentidos
estariam implicados no “observar”? Como “observar”? E para que fazê-lo?
Pensemos, ainda que apenas de relance, no
objeto do Observatório, o turismo, conforme expresso em sua denominação
(Observatório de Turismo). Lembremos que as lentes através das quais lançamos
nosso olhar sobre o turismo vão dar-lhe diferentes configurações, vão
repercutir na forma de o compreendermos e nas ações daí decorrentes. Em outras
palavras, somos levados a nos perguntar: Que turismo é esse que se pretende
observar? De que natureza? Atividade? Fenômeno? Sob que dimensões? Em que
relações? Com que abrangência? Em que contextos se desenvolve? Quem o
desenvolve? A compreensão desse objeto do olhar do Observatório, suas
características, suas repercussões requer, portanto, que o pensemos também em
seu universo conceitual – como não pode deixar de fazê-lo o pesquisador.
Pensemos também agora nos sentidos que se
poderia dar ao “observar”. Para isso, poderíamos nos remeter à evolução
etimológica do termo[1].
Ele foi ganhando novos sentidos ao longo do tempo, com uma estreita relação com
o seu contexto de inserção. Assim, por exemplo, é que, em torno do século X
assumia o sentido de conformar-se ao que
está prescrito em lei (a lei cristã, à época); assim é que, no século XVI,
se lhe atribuía o sentido de procurar
adivinhar o futuro e, ao mesmo tempo, no âmbito dos exércitos, o sentido de
examinar, cuidando, controlando. Espreitar,
espiar, fitar com atenção, notar, constatar, ponderar, chamar a atenção para,
são outros sentidos que assumiu ao longo do tempo, ora expressando a própria
relação sujeito-objeto, ora o produto que advém dessa relação para o sujeito,
ou para o objeto, ora o trânsito do produto para outros sujeitos postos em
relação.
Mas um sentido particular ganha força no
decurso do século XVII e para além dele: o sentido de “observar” como submeter à observação científica, o
que, em conformidade com o então entendimento de ciência, corresponderia a
submeter a uma observação impregnada pelo sensorial, pelo empírico, pelo
constatativo, pelo crivo confirmabilista, ou pela aceitação tácita da verdade
dos resultados obtidos.
Ora, adentramos já há uma dezena de anos, o
século XXI. As concepções de ciência mudaram, novos referentes teóricos
surgiram direcionando o olhar para o questionamento, para a corroboração
provisória dos resultados. Entretanto, mesmo transcorridos três séculos, mesmo
tendo sido desenhados novos cenários, novos contextos, não raras vezes o olhar,
o observar, vêm ainda impregnados ou direcionados pelo pensamento científico
daqueles tempos – passando ao largo dessas e de tantas outras mudanças.
É pensando no conjunto desses aspectos, que,
me parece, a Academia, encontra seu principal espaço de contribuição, sempre
dialogando com outros atores, como os aqui reunidos, os quais, igualmente,
aportam/aportarão seus saberes, suas práticas. Na Câmara de Estudos e Pesquisas
– Observatório de Turismo, criada e aprovada pelo Conselho Estadual de Turismo,
ela estaria presente sistematizando, produzindo, tornando acessível o
conhecimento científico no âmbito do turismo e, assim, contribuindo para
balizar o olhar, o “observar”, para balizar consequentes ações, interpretações,
juízos e decisões que venham a ser tomadas.
Isso significa, conforme característico da
prática do pesquisador, buscar guiar-se e guiar com um pensar vigilante: vigilante em relação aos sentidos conferidos ao “observar”, assim
como em relação às próprias bases teóricas selecionadas, tomadas como
pressupostos nos estudos, nas pesquisas (o que, no discurso da ciência, eu
chamaria de vigilância epistemológica). Significa buscar guiar-se e guiar com
um pensar vigilante em relação aos
contextos de inserção do objeto “turismo”, não apenas caracterizando-os,
reduzidos de sua complexidade, mas problematizando-os; com um pensar vigilante em relação a eventuais
interferências contingenciais, a eventuais interferências diretivas de
elementos que possam advir do próprio contexto; vigilante em relação aos processos, meios, recursos, selecionados
ou utilizados para a pesquisa; vigilante,
particularmente, em relação a como se “observam”, como se olham, se interpretam
os resultados obtidos e a que fins são destinados. Porém, isso significa também
guiar-se e guiar com a clareza do pesquisador de que, nas interfaces das
diferenças e das especificidades ligadas aos diversos campos de atuação dos
diferentes atores integrantes do universo turístico, é que se situam os mais
ricos espaços de aprendizagem, de potencial de crescimento, de desenvolvimento
individual e coletivo, quando todos se abrem para outras/novas perspectivas de
pensar o turismo.
Este evento passa, portanto, a constituir-se,
indiscutível e privilegiadamente, um desses espaços. Por isso, a importância de
estarmos aqui juntos, atentos, vigilantes, refletindo. Por isso a importância
de cumprimentar seus idealizadores e de reiterar que, da melhor forma que
pudermos, nós, professores e pesquisadores das Instituições que aqui
represento, estaremos vigilantes
para, sempre com zelo e responsabilidade, naquilo que nos couber, responder aos
chamados que nos forem feitos.
[1]
Diccionnaire du Centre National de Ressources Textuelles et Lexicales.
Disponível em: http://www.cnrtl.fr/etymologie/observer.
Acesso em 15 out. 2014.
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