sábado, 25 de outubro de 2014

I SEMINÁRIO OBSERVATÓRIO DE TURISMO DO RS


Os professores Márcia Cappellano dos Santos e Antonio Jorge Fernandes ambos do Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hospitalidade – UCS, e o professor Michel Bregolin, do Programa de Hospitalidade – UCS,  tiveram participação de destaque no I Seminário Observatório de Turismo do Rio Grande do Sul, realizado no ultimo dia 18 de outubro, em Porto Alegre. Promoção da Secretaria de Turismo do Estado, o evento teve por objetivo discutir a importância dos observatórios, ao reunir e consolidar informações sobre a atividade turística, que sirvam de ferramenta auxiliar para tomada de decisões por autoridades públicas e privadas. Nesse sentido, como destacou a represente da Secretaria de Turismo, Camila L. Silva, são de extrema importância as parcerias entre poder público e academia, para que tais objetivos sejam alcançados
Na primeira mesa do Seminário – “Estudos e Pesquisas no Turismo Analisados pelo Viés Ecônomico” - falaram os economistas Leandro de Lemos (PUCRS), Antonio Jorge Fernandes (UCS), Carlos Paiva (FACCT) e Wilson Rabahy (USP). Lemos destacou discussões realizadas desde 1998, no âmbito do Curso de Turismo da PUCRS, que já então buscavam construir redes de parceiros, como um espaço de dialogo democrático com a sociedade, voltadas para um turismo que priorizasse o desenvolvimento social e humano, como um valor a nortear as ações na área. Um turismo onde houvesse a produção própria de riqueza e não apenas transferência de renda. Ainda segundo o mesmo economista, entender o turismo academicamente como uma atividade multidisciplinar exige humildade teórica no seu estudo e pesquisa, para que todos as facetas do processo de produção turística sejam consideradas.
Rabahy registrou que o turismo tem crescido a 4.13% ao ano, um pouco acima do PIB mundial, que cresce a 3.45%. Lembrou que o receptivo é contratado nas regiões ricas, mas que a tendência de longo prazo será para a descentralização. As pesquisas registram que o receptivo ainda se concentra nas regiões mais ricas, mas  que a maioria absoluta das viagens se dão dentro do próprio continente do viajante, muito embora as viagens internacionais mobilizem maiores valores. O maior emissor é a Europa, mas também o maior receptor, ou seja, teríamos um turismo de região rica para região rica. Hoje, 15 países concentram 51% das receitas e dos gastos turísticos. No Brasil, 50% dos turistas originam-se na própria América Latina , embora esse número já tenha sido de 70%, a metade deles com acesso via terrestre. Outro dado apresentado por Rabahy é de que, quanto maior a distância percorrida pelo turista, maior será o seu gasto no destino.
Paiva destacou que seu próprio conceito de turista, considerando como tal quem ganha em um lugar e gasta em outro. O economista pretendendo com isso questionar alguns conceituados vigentes, no que se refere ao turismo. Destacou, ainda a figura e a importância do que chama de turista permanente, compreendendo por tal pessoas como os aposentados, por exemplo, que na situação de liberação das atividades profissionais passam a residir em localidades turísticas. Citou pesquisa por ele realizada em Foz do Iguaçu, por ele realizada, que utilizou o que considera como novas formulações conceituais, para concluir que 50% da renda local tem por sua origem no turismo. Para chegar a esse número, comparou as médias estaduais com as médias locais em diferentes setores econômicos, concluindo que as diferenças locais, para mais, seriam de origem turística.
Antonio Jorge Fernandes apresentou a situação de Portugal, país que, segundo ele,  possui uma área que é de um quarto a do Rio Grande do Sul, mas que possui quase a mesma população do Estado sul brasileiro, e que receberia 10 milhões de turistas ano. Tal volume de turistas significaria um impacto econômico de 10% do PIB do país luso,  ocupando 8% da mão de obra e significando 46% das exportações de serviços
Na mesa seguinte – “Estudos e Pesquisas no Turismo Analisados pelo Viés Sociológico” - com coordenação de Beatriz Paulus, os professores Mário Riedl e Marutscka Moesch destacaram as implicações sociais e antropológicas do turismo. Para Moesch, acolher seria a categoria fundaste do turismo. Sob o ponto de vista sociológico, para falar sobre Observatório seria necessário questionar, por exemplo, o que é o observar. Ou, perguntar para que serve / servirá o dado coletado. Tentativas de construir um único parâmetro de conhecimento demonstraram-se infrutíferas. Para Moesch, as contas satélites nada mais seriam do que tentativas de domesticar dados que são, por natureza, indomesticáveis. O turismo é por natureza transgressor, sistêmico, complexo e interdisciplinar. E citou como exemplo a implantação do ônibus turístico de Porto alegre, alcançada via orçamento participativo da cidade, o que só foi alcançado com auxílio dos papeleiros, um dos grupos melhor organizados para alcançar seus objetivos, dentro do OP. Os modelos tradicionais, hoje, seriam insuficientes porque não estamos, mais, em presença do turismo de massa dos anos 1970, mas de um turista que poderá ir, sim, a uma localidade como Santa Vitória do Palmar, se tal for para ele o vivenciar uma experiência diferenciada (antes, um palestrante desqualificara tal localidade nas suas possibilidades turísticas). Segundo Moesch, outros dados precisam ser cruzados pelos observatórios de turismo, como por exemplo, o da grande presença de mão de obra feminina, cuja escolaridade media continua sendo baixa, mas que são chefes de família e moram longe do local de trabalho. São mulheres expostas a percorrer longas distancias, além da dupla ou tripla jornada de trabalho, o que inviabiliza sua participação em cursos do Pronatec, por exemplo. Para esses casos, estudos que utilizem, por exemplo, como metodologia a teoria de campo, de Bourdieu, poderiam ser úteis.
No período da tarde, foram outras mesas apresentaram dados estatísticos, embora fosse questionada a cultura estatística da comunidade turística. Michel Bregolin, Pablo Herrera (Argentina) e Álvaro Sanguinetti (Uruguai) integraram a mesa “ Apresentação de Dados que Subsidiem a a Composição de Núcleos de Estudos e Pesquisas”. Mário Cabral, do Ministério do Turismo, realizou a palestra “Núcleos de Estudos e Pesquisas em Turismo”. 
Na mesa de abertura do evento, a professora Márcia M. Cappellano dos Santos, do Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade de Caxias do Sul, destacou na sua fala, a concepção de Observatório de Turismo. A seguir, reproduzimos na íntegra, a sua explanação.

OBSERVATÓRIO DE TURISMO PELA DRA. MARCIA MARIA CAPPELLANO DOS SANTOS
Na qualidade de representante, no Conselho Estadual de Turismo, das instituições que têm o turismo como objeto de pesquisa, como objeto de estudo nos diferentes níveis de ensino, quero primeiramente registrar meu agradecimento pela oportunidade de integrar esta mesa e aqui tentar ser portadora da voz da Academia referentemente à sua colaboração na implementação Câmara de Estudos e Pesquisas – Observatório de Turismo e, de modo especial, relativamente a este importante evento.
Sem querer me estender – não é essa minha intenção –, creio que este seria um  momento de suscitar uma reflexão sobre o “observar”, verbo que está na raiz do termo Observatório, este, que seria, então, um espaço destinado à observação. Trago assim algumas questões para juntar-se às reflexões previstas e que se desenrolarão ao longo deste dia: O que se pode/deve observar? Que sentidos estariam implicados no “observar”? Como “observar”?  E para que fazê-lo?
Pensemos, ainda que apenas de relance, no objeto do Observatório, o turismo, conforme expresso em sua denominação (Observatório de Turismo). Lembremos que as lentes através das quais lançamos nosso olhar sobre o turismo vão dar-lhe diferentes configurações, vão repercutir na forma de o compreendermos e nas ações daí decorrentes. Em outras palavras, somos levados a nos perguntar: Que turismo é esse que se pretende observar? De que natureza? Atividade? Fenômeno? Sob que dimensões? Em que relações? Com que abrangência? Em que contextos se desenvolve? Quem o desenvolve? A compreensão desse objeto do olhar do Observatório, suas características, suas repercussões requer, portanto, que o pensemos também em seu universo conceitual – como não pode deixar de fazê-lo o pesquisador.
Pensemos também agora nos sentidos que se poderia dar ao “observar”. Para isso, poderíamos nos remeter à evolução etimológica do termo[1]. Ele foi ganhando novos sentidos ao longo do tempo, com uma estreita relação com o seu contexto de inserção. Assim, por exemplo, é que, em torno do século X assumia o sentido de conformar-se ao que está prescrito em lei (a lei cristã, à época); assim é que, no século XVI, se lhe atribuía o sentido de procurar adivinhar o futuro e, ao mesmo tempo, no âmbito dos exércitos, o sentido de examinar, cuidando, controlandoEspreitar, espiar, fitar com atenção, notar, constatar, ponderar, chamar a atenção para, são outros sentidos que assumiu ao longo do tempo, ora expressando a própria relação sujeito-objeto, ora o produto que advém dessa relação para o sujeito, ou para o objeto, ora o trânsito do produto para outros sujeitos postos em relação.
Mas um sentido particular ganha força no decurso do século XVII e para além dele: o sentido de “observar” como submeter à observação científica, o que, em conformidade com o então entendimento de ciência, corresponderia a submeter a uma observação impregnada pelo sensorial, pelo empírico, pelo constatativo, pelo crivo confirmabilista, ou pela aceitação tácita da verdade dos resultados obtidos.
Ora, adentramos já há uma dezena de anos, o século XXI. As concepções de ciência mudaram, novos referentes teóricos surgiram direcionando o olhar para o questionamento, para a corroboração provisória dos resultados. Entretanto, mesmo transcorridos três séculos, mesmo tendo sido desenhados novos cenários, novos contextos, não raras vezes o olhar, o observar, vêm ainda impregnados ou direcionados pelo pensamento científico daqueles tempos – passando ao largo dessas e de tantas outras mudanças.
É pensando no conjunto desses aspectos, que, me parece, a Academia, encontra seu principal espaço de contribuição, sempre dialogando com outros atores, como os aqui reunidos, os quais, igualmente, aportam/aportarão seus saberes, suas práticas. Na Câmara de Estudos e Pesquisas – Observatório de Turismo, criada e aprovada pelo Conselho Estadual de Turismo, ela estaria presente sistematizando, produzindo, tornando acessível o conhecimento científico no âmbito do turismo e, assim, contribuindo para balizar o olhar, o “observar”, para balizar consequentes ações, interpretações, juízos e decisões que venham a ser tomadas.
Isso significa, conforme característico da prática do pesquisador, buscar guiar-se e guiar com um pensar vigilante: vigilante em relação aos sentidos conferidos ao “observar”, assim como em relação às próprias bases teóricas selecionadas, tomadas como pressupostos nos estudos, nas pesquisas (o que, no discurso da ciência, eu chamaria de vigilância epistemológica). Significa buscar guiar-se e guiar com um pensar vigilante em relação aos contextos de inserção do objeto “turismo”, não apenas caracterizando-os, reduzidos de sua complexidade, mas problematizando-os; com um pensar vigilante em relação a eventuais interferências contingenciais, a eventuais interferências diretivas de elementos que possam advir do próprio contexto; vigilante em relação aos processos, meios, recursos, selecionados ou utilizados para a pesquisa; vigilante, particularmente, em relação a como se “observam”, como se olham, se interpretam os resultados obtidos e a que fins são destinados. Porém, isso significa também guiar-se e guiar com a clareza do pesquisador de que, nas interfaces das diferenças e das especificidades ligadas aos diversos campos de atuação dos diferentes atores integrantes do universo turístico, é que se situam os mais ricos espaços de aprendizagem, de potencial de crescimento, de desenvolvimento individual e coletivo, quando todos se abrem para outras/novas perspectivas de pensar o turismo.
Este evento passa, portanto, a constituir-se, indiscutível e privilegiadamente, um desses espaços. Por isso, a importância de estarmos aqui juntos, atentos, vigilantes, refletindo. Por isso a importância de cumprimentar seus idealizadores e de reiterar que, da melhor forma que pudermos, nós, professores e pesquisadores das Instituições que aqui represento, estaremos vigilantes para, sempre com zelo e responsabilidade, naquilo que nos couber, responder aos chamados que nos forem feitos.

  





[1] Diccionnaire du Centre National de Ressources Textuelles et Lexicales. Disponível em: http://www.cnrtl.fr/etymologie/observer. Acesso em 15 out. 2014.

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